Sociedade das Almas Perdidas

Ultimamente não se vê por aí seres humanos; o que encontramos nas vastas terras são os profanos, habitantes das alturas de ferro, e fantoches, trancados nos quartos escuros por trás das cortinas que não querem remover. O que resta, então, são os hereges, as almas perdidas, rondando nos exterior das torres, em derredor do imenso campo enevoado. Onde estão as fronteiras? Onde está o limite? Quando se chega ao além, ao incognoscível?

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sábado, agosto 27, 2005

Anjo Caído (III)

Nós dois nos sentamos e Semjaza, depois de olhar brevemente para o céu, prosseguiu:
- Havia um anjo chamado Azazel, um hábil em forjar armas, e...
- Amigo seu?
- Não interrompa. Mas ele era, sim, embora... Ah, ele era muito mais imponente que eu, a propósito. E sabe, ele fazia eu me sentir inferior por causa disso. Desgraça!
- Algum motivo específico?- perguntei com interesse.
- Bah. O caso é que Azazel era... ufs, popular. Sempre cercado por admiradores enquanto eu-- enfim...
- Hum. Acho que entendo. Ciúmes?
- Sim, eu sentia uma inveja tremenda dele, e daí?
- Já entendi. Mas você continuou sendo amigo dele ou se declarou um adversário, para ficar abertamente contra ele?
- As duas coisas. Digo, andávamos juntos por aí, tramamos juntos contra o Demiurgo e juntos lideramos a rebelião. Confiávamos plenamente um no outro, e só entre nós fazíamos confidências. Enfim, não sei até que ponto ele era melhor que eu, mas em geral todos pensavam que eu era só mais um adulador chato seguindo seus calcanhares, por outro lado me respeitavam justamente por eu andar à sombra dele. Pudera, não tinha coragem de insultar o cão quem tivesse medo de ofender o dono, então até aí era proveitoso manter a aparência de subalterno perto dele, que em termos de ataque e defesa era de fato superior à maioria.
- E isso era um abalo na sua vontade de poder?- indaguei.
- Sim. E era um incômodo, porque na verdade eu nem queria vê-lo como um rival, e talvez ele nem soubesse que eu sentia isso. Quanto a mim, eu não sabia ao certo no que pretendia superá-lo, a propósito. Hum, talvez em mero reconhecimento, mesmo que não fosse verdadeiro, já que todos eram aduladores em relação a ele e eu queria uma pontinha disso também para alimentar a vontade de potência. Um elogio disfarçado é alimento que farta, mas causa dependência depois. Azazel tinha um reservatório disso, enquanto eu permanecia na carência; nunca fiquei perguntando se era justo. Com a vontade de potência não há justiça, nem civilidade, nem acordos; há o ego e a necessidade, e só.
- E como você superou isso?
Semjaza brilhou para mim um sorriso estranho, triunfante, quase não parecendo mais um anjo caído. Imaginei como ele devia ser nos tempos do esplendor do Empíreo, e como seria o tal Azazel, se é que fora tão superior assim. A hierarquia dos anjos era essencialmente burocrática, então algum de casta mais baixa muito poderia ser mais imponente que o próprio Demiurgo- embora fosse improvável, já que este havia expulso os revoltosos, mesmo. Quanto a Semjaza, nem sei que ponto ocupava na hierarquia, mas decerto era um dos mais altos, legitimamente. Foi então que ele me contou algo mais curioso:
- Eu era superior ao Azazel na hierarquia, por isso fui eu, e não ele, quem liderou a revolta. Eu fiquei, na realidade, mais ofendido ainda com isso, porque supus que os estava liderando por conveniência. Mas se você quer saber como... hum, superei, vou chegar lá. Primeiro, a rebelião.
- Ah, sim. Vocês dois lideraram juntos mesmo?
- Ufs. Eu era oficialmente o líder, mas ele... enfim, deixe para lá, você faz idéia de como é. Mas haveremos de convir que eu tinha ótimas idéias. Com aquilo, eu consegui finalmente algum reconhecimento, mas não me pareceu o bastante; é a dependência, passei a precisar de mais ainda. A vontade de poder é terrível... Pensei que só conseguiria acabar com ele quando tomasse o lugar do próprio Demiurgo! E curiosamente, eu não sentia a mínima inveja dele. Combatia-o como adversário político, mas desprezava-o em absoluto como um rival de ego.
- Paradoxal. Não era ele o mais poderoso, afinal de contas? Como poderia ter o seu desprezo assim?
- Podia ser- reluziu Semjaza-, no entanto ele não era o mais querido. Pelo contrário, era muito infame, respeitado com falsidade e hipocrisia, e nisso eu só conseguia enxergar mediocridade. Na luta pela vontade de potência, meu amigo Azazel era mais meu adversário que o próprio Demiurgo por causa disso; pois o Demiurgo não tinha nada que eu poderia querer.
- Então, por mais poderoso que alguém seja, não abala a vontade de poder de quem não quer nada que o dito cujo possua?
- Basicamente.
- Então, como você superou o Azazel, se é que isso aconteceu?
- Aí é que está... Combatemos contra o Demiurgo-- mas definitivamente não quero falar agora sobre a nossa derrota-- e fomos expulsos do Empíreo. Nem sei para onde Azazel foi exilado, e eu, naturalmente, vim parar aqui mesmo.
Silêncio. Cocei a cabeça, intrigado, e nem esperei que ele continuasse:
- Acabou? Mas você superou o sujeito ou não?
- Nem sei. Acontece que, quando cheguei aqui, descobri criaturas muito mais imponentes que Azazel e outros anjos, então isso anulou a antiga rivalidade e meu deu uma nova perspectiva, um desejo maior para a vontade de potência. Um antigo adversário foi camuflado por outro. Aquilo me intrigou por um instante, já que eu conhecia aquele anjo desde a sua queda e não sabia de que adversário ele falava agora.
- Coisa estranha- comentei- isso ter acontecido depois da queda. Mas então, qual é essa fonte maior para a vontade de poder?
Semjaza passou o braço em torno do meu pescoço e me puxou para junto de si, como para contar um segredo, e sussurrou:
- Eis a humanidade e seu mundo sob os céus.

5 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

E o nosso livro? hehehe!
abraços!

1:05 PM  
Blogger Unknown disse...

fico imaginando quando vou poder morrer.
(vc sabe o que significa seu nome em alguns lugares remotos?)

4:10 PM  
Anonymous Anônimo disse...

Semjaza Não compreendeu que o poder não é dado para quem que, mais para quem merecer.
Como opção, ele não compreendeu que todos temos um plano maior para nossa vida, em ação do tenpo podemos comtruir nossos sonho mas só se pode comprende essa relação do mundo com universo se existir o amor o amor é base que liga os dois mundos atrais.

10:41 AM  
Anonymous &ana disse...

o amor é a base do conhecimento:

10:45 AM  
Anonymous Anônimo disse...

Ele esta comigo sempre meu amigo azazel

11:24 PM  

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